Por Fernando Mantovani
Mais da metade (59%) dos 387 profissionais entrevistados durante a sondagem do Match Perfeito, estudo da Robert Half em parceria com o Centro de Liderança da Fundação Dom Cabral, afirmaram que costumam buscar proativamente oportunidades de emprego em outras empresas mesmo estando empregados. Muitas pessoas podem não ver problema nesse movimento, afinal que mal pode haver em dar uma sondada para entender se a grama do vizinho está mais verdinha ou aferir o próprio nível de valorização aos olhos do mercado.
O que me preocupa é o que pode estar motivando essa proatividade dos profissionais. O estudo aponta que a maioria tem o hábito de ouvir o que o mercado tem a oferecer na esperança de encontrar melhor remuneração, melhor perspectiva de crescimento e benefícios não monetários mais atrativos. Alguns indicaram que, na empresa na qual atuam hoje, o plano de carreira simplesmente nem existe.
Fico preocupado porque, em muitos casos, os gestores não fazem ideia desse universo paralelo que existe na organização. Tocam o dia a dia como se tudo estivesse sob controle. Então, quando são surpreendidos com o pedido de desligamento, lançam mão da equivocada medida emergencial de retenção que faz tão mal para a carreira do profissional e para os negócios: a contraproposta.
Vou listar cinco razões que acredito fazerem da contraproposta um risco invisível e fatal para a relação entre empregado e empregador:
1. É uma ferramenta emergencial
Pode acontecer de o empregador usar a contraproposta apenas como uma forma de ganhar tempo para não ficar com a cadeira vaga, enquanto busca outra pessoa para a posição.
2. É possível que o profissional volte a ter insatisfação
Em geral, o motivo que leva um profissional a avaliar outra oportunidade não é financeiro. Pode ser algo relacionado ao clima organizacional, à estagnação na carreira ou ao mau relacionamento com pares ou gestor, entre outras questões. Ou seja, o aumento gerado pela contraproposta pode gerar satisfação momentânea. Mas, no médio ou longo prazo, o profissional pode desejar sair novamente.
3. O profissional se tornará caro para a empresa e o mercado
Ao aumentar o salário do colaborador sem programação prévia, corre-se o risco de exceder o orçamento da área. Para o empregado, o risco é de ficar com o salário acima da média do mercado, o que poderá dificultar futuras movimentações e, até mesmo, futuros aumentos salariais na empresa de atuação.
4. Na necessidade de cortes, o colaborador corre o risco de ser um dos primeiros
A imagem de aparente insatisfação somada a um aumento salarial que não estava programado pode fazer com que o profissional seja considerado pelo empregador na lista de colaboradores a serem demitidos, caso haja necessidade.
5. A relação de confiança ficará abalada
Seja qual for o tom do diálogo no momento da contraproposta, é possível que o empregador sempre veja o colaborador que aceitou ficar como alguém que pode pedir demissão a qualquer momento. Com relação ao empregador que recebeu a recusa, em decorrência da contraproposta, ele tende a avaliar o profissional como alguém motivado apenas por remuneração.
Particularmente, eu nunca fui a favor da contraproposta, mesmo quando não ocupava cargo de liderança. Acredito no poder do diálogo honesto e gentil para abordar e resolver insatisfações e sempre prezei por trabalhar em organizações que se empenham para que os profissionais tenham motivos para ficar no dia a dia, não apenas quando eles desejam pedir demissão.
Rotatividade zero pode ocultar um comodismo de alguma das partes, enquanto a frequência das demissões também é um sinal de alerta. Mas, em níveis saudáveis, perder um profissional pode ser uma ótima oportunidade de oxigenar as ideias dentro da companhia. O que não dá é para transformar a organização em um ambiente de leilão.
Quem aceita ou faz uma contraproposta não cria uma oportunidade. Na verdade, perdeu outra.
* Fernando Mantovani é diretor geral da Robert Half para a América do Sul